terça-feira, 13 de agosto de 2024

HERMANN HESSE “ÁRVORES”

HERMANN HESSE 
“ÁRVORES” 
SABADO 27 DE JULHO DE 2024

Para mim, as árvores sempre foram os pregadores mais penetrantes. 

Eu as reverencio quando elas vivem em tribos e famílias, nas florestas e bosques.

E eu as reverencio ainda mais quando elas estão sozinhas.

Elas são como pessoas solitárias.

Não como eremitas, que se perderam por alguma fraqueza, mas como grandes homens solitários, como Beethoven e Nietzsche.

Em seus galhos mais altos o mundo sussurra

Suas raízes descansam no infinito.

Mas elas não se perdem lá; elas lutam com toda a força de suas vidas para uma única coisa: realizar-se de acordo com suas próprias leis, para construir a sua própria forma, para representar a si mesmo.

Nada é mais sagrado, nada é mais exemplar do que uma árvore, bela e forte.

Quando uma árvore é cortada e revela a sua morte ferida nua para o Sol, pode-se ler a sua história inteira no disco luminoso, inscrito em seu tronco: nos anéis dos seus anos, suas cicatrizes, toda a sua luta, todo o seu sofrimento, todas as suas doenças, toda a sua felicidade e prosperidade estão realmente escritas, os anos difíceis e os anos de luxo, os ataques resistidos, as tempestades vencidas.

E cada jovem das roças sabe que a madeira mais nobre e mais sólida tem os menores anéis, que no alto das montanhas e em perigo permanente são as árvores mais indestrutíveis, mais fortes, mais ideais, que crescem.

Quem sabe como falar com elas, e quem saber ouvi-las, pode aprender a verdade.

Elas não pregam a aprendizagem ou preceitos.

Elas pregam, sem se abalar, a antiga lei da vida.

Uma árvore diz: um núcleo está escondido em mim, uma faísca, um pensamento, eu sou a vida da vida eterna.

A tentativa e o risco que a mãe eterna tomou comigo é único, exclusivas as formas e as veias da minha pele, único também a menor das folhas em meus galhos e a menor cicatriz da minha casca.

Eu fui criada para formar e revelar o eterno em cada um dos meus pequenos detalhes.

Uma árvore diz: minha força é a confiança.

Não sei nada sobre meus pais, eu não sei nada sobre as milhares de crianças que a cada primavera nascem de mim.

Eu vivo o segredo da minha semente até o fim, e eu não me importo com nada além disso.

Eu confio que Deus está em mim.

Eu confio que o meu trabalho é sagrado.

É dessa confiança que eu vivo.

Quando somos feridos e não podemos mais suportar nossas vidas, então a árvore tem algo a nos dizer: atenção!

Atenção!

Olhe para mim!

A vida não é fácil, a vida não é difícil.

Esses são pensamentos infantis.

Deixe Deus falar dentro de você e seus pensamentos irão crescer em silêncio.

Você está ansioso porque o seu caminho conduz para longe da mãe e do lar.

Mas cada passo e cada dia o levam de volta para a mãe.

O lar não está aqui nem lá.

Ou o lar está dentro de você, ou o lar não está em lugar algum.

Uma ânsia para vagar arranca lágrimas do meu coração quando ouço as árvores farfalhando ao vento durante a noite.

Se alguém ouve em silêncio por um longo tempo, esse desejo revela o seu núcleo, o seu significado.

Não é tanto uma questão de escapar de um sofrimento, embora possa parecer assim.

É uma saudade de casa, de uma memória da mãe, de novas metáforas para a vida.

Isso o leva para casa.

Cada caminho leva em direção a casa, cada passo é o nascimento, cada passo é a morte, cada túmulo é a mãe.

Assim, a árvore sussurra à noite, quando estamos inquietos diante dos nossos próprios pensamentos infantis: árvores têm pensamentos longos, uma respiração longa e tranquila, assim como elas têm uma vida mais longa que a nossa.

Elas são mais sábias do que nós, enquanto nós não as ouvirmos.

Mas quando aprendemos a ouvir as árvores, a brevidade e a rapidez e a pressa infantil de nossos pensamentos alcançam uma alegria incomparável.

Quem aprendeu a escutar as árvores já não quer ser uma árvore.

Ele não quer ser nada, exceto o que ele é.

Isso é estar em casa.

Isso é a felicidade.

Canal: Hermann Hesse

Tradução: DE CORAÇÃO A CORAÇÃO 

https://www.sementesdasestrelas.com.br/2024/07/hermann-hesse-arvores.html

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