segunda-feira, 25 de março de 2013

Ceticismo científico ou não?

segunda-feira, 4 de março de 2013
Ceticismo científico ou não?
Dando prosseguimento ao nosso tema da semana passada, quando tratamos do espírito crítico e o espírito da crítica, vamos abordar um dos pontos medulares da demarcação entre ciência e não ciência que é o ceticismo científico cujo motor principal é o pensamento crítico.
O termo ceticismo derivado do termo grego sképtomai, que significa “olhar à distância”, “examinar”, “observar” fundamentou-se na premissa da própria impossibilidade humana de obter certeza absoluta a respeito da verdade, daí o fato de não se aceitar explicações sobre a realidade que não possam ser comprovadas experimentalmente ou persistirem incólumes quando examinadas sob a ótica de um profundo senso crítico.
o ponto de vista científico essa postura questiona de forma constante e metódica a veracidade de qualquer alegação, buscando permanentemente os argumentos necessários que possam ou corroborá-las ou invalidá-las.
Evidentemente esse processo é realizado sempre de acordo com o método científico, tendo em maior instância a aplicação do próprio princípio da falseabilidade proposto por Karl Popper no início do século XX.
Em muitas discussões acaloradas, é comum usar-se o termo “cético” até como tentativa de depreciação denominando o alvo do ataque como sendo um sujeito de “mente fechada”.
Aliás, o principal defensor do ceticismo científico, Carl Sagan (foto) acima cunhou uma máxima a esse respeito:
“Você deve manter sua mente aberta, mas não tão aberta que o cérebro caia”.
Daí o rigor com qual devemos avaliar as “conclusões” que são sacramentadas apenas pelo senso comum ou ideias equivocadas tidas como verdades inquestionáveis há séculos, simplesmente porque fazem parte de uma antiga tradição.
O termo cético foi bem vivido e bem utilizado pelo eminente químico inglês Robert Boyle.
Seguindo o exemplo de Galileu, Boyle escreveu, em 1661, o livro “O químico cético” em forma de diálogo, no qual critica a visão aristotélica de mundo e defende a teoria corpuscular da matéria.
Um dos grandes méritos desse livro foi trazer para a Química uma visão lógica da natureza.
Ele mesmo disse:
“Até hoje os químicos sempre pensaram que seu trabalho fosse limitado à preparação de beberagens ou à transmutação dos metais.
Em vez disso, eu procuro considerar a química de modo diferente, não como poderia fazer um médico ou um alquimista, mas como um filósofo.
Se os homens pensassem no progresso da ciência mais do que em seu próprio vício de pensar, facilmente se convenceriam a confiar na observação, e a não enunciar uma teoria sem antes haver feito ensaios e experimentações do fenômeno a que essa teoria se refere.”
Ele defendia a ideia de que os pressupostos fundamentados nos argumentos de autoridade e na tradição deviam dar lugar aos fatos experimentais e à comprovação e de que não devíamos aceitar os dogmas assim tão facilmente.
Naquela época defendia-se que toda a natureza era construída por quatro elementos: terra, forro, água e ar, ideia fundamentada no argumento de autoridade do grande filósofo Empédocles que viveu no século III aC.
Ora, era evidente para qualquer estudioso nascido em 1600 que a madeira, por exemplo, era formada pela conjugação de fogo + terra + água + ar.
Quando se planta uma árvore ela se fixa na terra, usando-a em seu desenvolvimento juntamente com a água e o ar, produzindo, assim, a madeira.
Quando se incendeia a lenha, o fogo, que também compõe a madeira, é então libertado.
Simples, não?
Porém, completamente errado!
Essa explicação da natureza persistiu por quase 2200 anos desde sua concepção.
Por quantos séculos mais, essa ideia criada por Empédocles, adotada por Aristóteles e depois defendida pela Igreja Católica seria ainda sustentada como verdadeira, não fossem os esforços de céticos como Robert Boyle?
O ceticismo é um dos mecanismos de proteção que a ciência dispõe contra a sua própria falibilidade.
Por essa razão faz parte inseparável do método científico.
Todo o cientista tem obrigação de ser cético.
E como já dissemos, seu principal motor é o espírito crítico.
Saber criticar é saber defender-se do erro, do engano e da fraude.
Evidentemente o livre pensador pode tornar-se inconveniente quando a mira de seu ceticismo científico não se limitar mais ao seu laboratório.
Quando, por exemplo, os produtos anunciados na TV, desde terapias milagrosas para emagrecer até a plataforma de políticos em campanha passassem a ser examinados pelo senso crítico de um cético de plantão, as coisas poderiam se complicar um pouco.
Existem muitos argumentos de autoridade que não sobreviveriam e muitas autoridades com argumentos que poderiam não gostar muito dessa tal liberdade de pensar.
Ou não?
Mustafá Ali Kanso

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