Duas dezenas de oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB)
estiveram envolvidos em uma missão sigilosa no meio da selva amazônica, no
Pará, 30 anos atrás.
Denominada Operação Prato, ela é a mais
impressionante investigação de óvnis (objetos voadores não
identificados) realizada pela Aeronáutica que se conhece.
É uma espécie de caso Roswell brasileiro,
com missões secretas,
histórias e fenômenos sem explicação.
Enquanto em Roswell, marco da
ufologia mundial, os militares americanos primeiro admitiram a existência dos
óvnis e depois negaram, os relatórios da FAB não deixam dúvidas:
os oficiais do I Comando Aéreo Regional (Comar),
em Belém,
designados para a operação, que ocorreu nos quatro
últimos meses de 1977, afirmam ter presenciado - mais de uma vez - UFOs cruzando
o céu da Amazônia.
Detalhes da Operação Prato estão em relatórios
sigilosos que acabam de ser liberados pelo governo federal para consulta no
Arquivo Nacional, em Brasília.
Desde o ano passado, estão vindo a público documentos, alguns
guardados há mais de 50 anos.
Todos os arquivos secretos de UFO estão sob
responsabilidade da Casa Civil desde 2005.
Há 1.300 folhas de um total estimado em 25 quilos de material,
com descrições, croquis e fotos de óvnis referentes a três lotes
de informações da FAB.
Os dois primeiros contêm relatos dos anos 50 e 60.
O último, aberto em maio e do qual faz parte a Operação Prato,
cobre a década seguinte.
No próximo mês, será a vez do acervo dos anos 80.
ISTOE recriou em desenhos
histórias contidas nos documentos.
Os arquivos também mostram que a Aeronáutica teve um
departamento específico de estudos sobre UFOs entre 1969 e 1972
O Sistema de Investigação de Objetos Aéreos Não Identificados (Sioani)
funcionava nas instalações do IV Comar, em São Paulo.
Composto por pesquisadores civis e autoridades militares, o
Sioani saía à procura de casos pelo País.
O material liberado revela com detalhes a doutrina desse
departamento - além de cerca de 70 casos apurados, todos retratados com
desenhos feitos pelos militares.
Entre o material disponível, a Operação Prato é
considerada a mais intrigante.
Das cerca de duas mil páginas de relatórios, 500 fotografias e
16 horas de filmagem documentadas pelos militares do I Comar, de Belém, apenas
200 páginas e 100 fotos tornaram-se públicas.
Há relatos de 130 avistamentos por militares e civis.
A missão, liderada pelo capitão da Aeronáutica Uyrangê Hollanda,
tinha como objetivo investigar as ocorrências provocadas por um
fenômeno batizado de chupachupa, que começou a ser relatado em 1976
por moradores da região oeste do Maranhão e se espalhou por Colares, a 80
quilômetros da capital paraense, como uma epidemia.
No total, 400 pessoas teriam sido atingidas por luzes que,
segundo os depoimentos, lhes sugavam o sangue.
Em um dos documentos oficiais, a médica Wellaide
Cecim, que tinha 24 anos na época e atendeu a maioria dos pacientes,
diz que os feridos apresentavam "paresia (amortecimento parcial
do corpo), cefaleia, tonturas, tremor generalizado e queimaduras de primeiro
grau, bem como marcas de pequenas perfurações"
Para desmistificar o
fenômeno, o capitão Uyrangê, junto com sua equipe, foi
designado para colher depoimentos durante o dia e ficar em vigília à noite
munido de máquinas fotográficas Nikon, com teleobjetivas de 300
mm a 1000 mm, filmadoras e gravadores.
FOTOS: JOÉDSON
ALVES/ISTOÉ; DIVULGAÇÃO. ILUSTRAÇÃO FERNANDO BRUM SOBRE FOTO DE FREDERIC JEAN
Acabou, porém, registrando e presenciando o que até então
acreditava ser ficção científica.
"Meu irmão viu várias naves",
contou à ISTOÉ Uyranê Soares de Hollanda Lima, referindo-
se ao chefe da Operação Prato, que morreu em 1997.
Comissário de bordo aposentado, Uyranê lembra
bem de uma ligação feita por Uyrangê, no auge das
investigações.
"Ele me disse: 'Hoje, um disco voador ficou a 50 metros da
minha cabeça.
Era do tamanho do (avião) DC-10 que você voa.
Filmei e fotografei tudo.'"
Para os ufólogos, o termo disco voador faz referência a objetos
de vários formatos e cores que não são aviões, executam diversos tipos de
manobras e aparecem em locais variados.
REVELAÇÃO
Foram liberados três lotes sobre UFOs dos anos 50, 60 e
70.
Em agosto, será a vez do material da década de 80
Há diversas ocorrências documentadas.
A de número 16 da pasta Registro de Observações
de Óvni, por exemplo, detalha um avistamento feito pelos militares, que
escrevem sobre um "corpo luminoso, emitindo lampejos azulados de
intensidade" de cor "amarela (âmbar ou quartzo-iodo)"
que percorria uma "trajetória de curva à direita, descendente e
ascendente" a uma velocidade estimada de 800 km/h.
Ele foi presenciado em Colares, às 19h do dia 1º de nov embro de
1977, pela equipe do I Coma r:
"Além da luminosidade, o óvni apresentava um pequeno semicírculo
avermelhado na parte superior
Sentido de deslocamento sudoeste/ nordeste.
Ausência de ruído ou deslocamento de ar."
Entre as informações
liberadas sobre a Operação Prato, não há registro de
contatos com ETs, tampouco explicação para o fenômeno do chupa-chupa.
RETRATO 200 páginas e 100 fotos da Operação Prato tornaram-se
públicas: missão na selva amazônica
Os arquivos, agora públicos, trazem depoimentos de civis, trocas
de correspondências entre militares sobre óvnis, recortes de jornais da época e
várias conversas entre pilotos e controladores de voos sobre estranhos
fenômenos no espaço aéreo nacional:
"Sierra Bravo Juliete, solicitaremos que... se possível,
nos fornecesse toda a performance desse objeto luminoso e faremos uma gravação
de vídeo, positivo?", comunica a torre de controle de
Brasília, como mostra um relatório, a uma aeronave, em
6 de dezembro de 1978.
"Afirmativo, inclusive (a luminosidade) está agora a
nossa direita,
nos acompanhando, ela aumenta e diminui a intensidade... está...
não é camada, não é nada... a gente vê que ela aumenta e diminui
a intensidade", responde o piloto.
Diante de fenômenos desconhecidos no céu, a
FAB orienta os pilotos a preencher um formulário.
Hoje, o sistema é informatizado, mas, até
meados dos anos 70, o papel ficava em bases aéreas e aeroportos.
Estima-se que só 10% dos pilotos façam isso.
No momento, apenas os relatórios de UFOs
classificados como reservados e confidenciais da Aeronáutica tornaram- se
públicos
Espera-se que o Exército e a Marinha façam o mesmo
São aguardadas, também, as páginas com os carimbos de secreto e
ultrassecreto.
Por lei, as que cumpriram 30 anos de ressalva deveriam ser
públicas, mas na prática não é o que ocorre.
"Não se quebra uma cultura de uma vez.
E eu não sou a favor
de divulgar documentos que ferem a privacidade das pessoas, induzem pânico à
população ou colocam a segurança do País em risco", defende o
brigadeiro José Carlos Pereira, ex-comandante de
operações da FAB e ex-presidente da Empresa Brasileira de Infraestrutura
Aeroportuária (Infraero)
MÉTODO
Além
de relatórios (acima), o Sioani submetia a
testemunha de um óvni a exames psicológicos
Hoje na reserva, o brigadeiro de 67 anos foi considerado por
muitos anos o guardião da chave do cofre de segredos ufológicos brasileiros.
Foi ele quem ordenou o recolhimento de todo material sigiloso
produzido sobre o tema espalhado em bases aéreas e aeroportos do Brasil.
A papelada foi levada para o Comando de Defesa
Aeroespacial (Comdabra), em Brasília, onde ele exercia a função de comandante- geral, no início da
década.
Mas somente no ano passado os documentos começaram a chegar ao
arquivo nacional.
Revirar os porões das Forças Armadas e revelar os segredos
ufológicos é uma tendência verificada em outros países
(leia quadro).
"Com essa abertura, a Aeronáutica reconhece a necessidade
de tratar o fenômeno UFO de maneira séria, deixando de lado o tom pejorativo
e irreverente que quase sempre aparece quando se levanta a plausível hipótese
de estarmos recebendo a visita de seres extraterrestres",
diz Ademar José Gevaerd, 47 anos,
coordenador da Comissão Brasileira de Ufólogos (CBU),
que elaborou uma campanha em prol da liberdade de informações sobre
UFOs
Hoje, a pessoa que quiser relatar a aparição de um óvni
dificilmente encontrará eco na FAB.
"A Aeronáutica não dispõe de estrutura especializada para
realizar investigações científicas", informou a
FAB à ISTOÉ.
Porém, durante o funcionamento do Sioani, no IV Comar, toda testemunha era submetida
a exames nos quais se avaliavam a presença de psicopatologia, o desvio de
personalidade ou a tendência à mitomania.
O Sioani procurava saber, ainda, a condição psicofísica da pessoa no
momento da observação (em jejum, alimentado, com teor alcoólico, cansado, trabalhando
ou distraído), se ela vivia tensões familiares ou políticas e qual religião
seguia.
O local da aparição
do Oani (objeto aéreo não
identificado, como o óvni era chamado à época) também era esmiuçado: tipo
de vegetação, umidade e temperatura aparecem citados nos relatórios.
ILUSTRAÇÃO FERNANDO BRUM SOBRE FOTO DE FREDERIC JEAN
"Admitir a 'possibilidade' de existência do oani é atitude
científica... penetrar no âmago do fenômeno, investigando- o sob os aspectos
psiquiátricos, psicológicos, sociológicos, astronômicos, meteorológicos,
jurídicos, etc, constitui uma necessidade.
Eis a posição em que se coloca o Ministério da Aeronáutica",
diz um dos dois boletins produzidos pelo Sioani,
que encerrou suas atividades supostamente porque pesquisar discos voadores não
interessava mais aos militares, em meio à repressão no País.
Para os ufólogos, seria fundamental a liberação das filmagens
feitas na selva amazônica para um estudo mais apurado dos fenômenos.
No momento, nenhuma das 16 horas de filmagens feitas em super-16
mm estão disponíveis para consulta.
Poucas pessoas fora do ambiente militar tiveram acesso a esse
material.
Pedagoga aposentada, em Belém, Nahima Lopes de
Oliveira Gonçalves assistiu às gravações.
Ela é filha do brigadeiro Protásio Lopes de Oliveira,
que era comandante do I Comar, em 1977.
"Papai chegava com os rolos de filmes e ia direto para a
biblioteca", conta ela, hoje, com 60 anos.
"Um dia, ele deixou a gente assisti-los.
Dava para ver luzes se deslocando em todos os sentidos",
completa, dizendo que
seu pai, morto há seis anos, sempre acreditou em óvnis.
Astrônomo do Laboratório Nacional de Astrofísica, de Itajubá
(MG),
Carlos Alberto Torres afirma não fazer o
menor sentido a iluminação em discos voadores
"Avião tem luzes para sinalizar para os outros",
diz.
Para o professor de astrofísica João Steiner,
da Universidade de São Paulo (USP), as histórias de
avistamentos de óvnis não passam de ocorrências naturais para as quais a
ciência ainda não tem explicação.
O brigadeiro Pereira endossa o ceticismo:
"Os fenômenos ocorrem, são investigados, tiram-se fotos e 98%
dos casos a ciência explica.
Agora, para os 2%, eu pergunto: cadê o ET, o pedaço da nave
capturada?"
Parentes e amigos do capitão Uyrangê,
que esteve à frente da Operação Prato, contam que ele teve até um contato
imediato de terceiro grau na margem do rio Guajará-Mirim, no Pará, em
dezembro de 1977
Ele e mais um oficial, também já morto, teriam avistado uma nave
de 100 m de comprimento, no formato de uma bola de futebol americano, pousar em
pé na outra margem do rio.
A cerca de 70 m do local, os militares teriam visto uma porta se
abrir no alto do objeto e um ET descer e flutuar sobre as águas.
Após ouvir o relato dessa experiência, o
comandante Protásio teria ordenado o fim da Operação Prato.
Nem o contato imediato e nem o epílogo da missão constam do
acervo liberado pelo Arquivo Nacional.
Se vierem a público, Roswell deverá
ficar a anos-luz das nossas histórias de UFOs
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