UM CONTO ESPECIAL:
O CAPATAZ JOSINO, NEGRO DONGÔ E PAI JOÃO
Há um bom tempo atrás, em uma fazenda brasileira, vivia um capataz com sua esposa e uma filha de 5 anos de idade.
Josino, o Capataz, era um homem muito bem quisto naquela fazenda.
Fazia seu trabalho sem exageros e sem faltar com suas obrigações. Tanto os negros quanto os senhores, donos da fazenda, gostavam dele e lhe tinham grande respeito.
Em certa feita, o senhor comprou mais negros para aquela fazenda e ao chegar com a nova “remessa”, Josino que acompanhava a recepção deles, bateu o olho em um negrinho que apresentava algumas cicatrizes nas costas e um ferimento que parecia crônico nos tornozelos.
Recebeu a todos, juntos aos demais capatazes, direcionando os negros para os seus devidos lugares.
Josino ficou inquieto ao ver aquela figura negra torcida, de olhar forte e profundo.
Aquele olhar o tocou profundamente!
Ao mesmo tempo que lhe era estranho também lhe era muito familiar.
Josino tinha grande apreço por um pai velho, um negro já envelhecido e muito sábio dali daquela fazenda.
Ele constantemente aconselhava Josino, instruía-o em algumas questões e sempre tinham momentos de um bom proseio.
Na fazenda, do meio para o final da tarde, sem falta, desfilava no ar, um cheiro de café vindo da senzala.
Josino adorava café, ainda mais se fosse feito pela negra vó da fazenda.
Ele sentia de longe aquele perfume e já ia se dirigindo para perto:
“Que cheiro bom, vó”!
"O Café tá servido, Josino!
Tá no bule, fique à vontade!”
Vó era uma negra que já tinha deixado a mocidade há um bom tempo, muito bondosa e sempre que Josino ia tomar seu cafezinho,
ela, com a mão fechada, esfregava as juntas dos dedos rapidamente na cabeça dele.
“Ai, Véia, isso dói!”
- Exclamava Josino segurando a cabeça.
Ela ria e dizia: “Deixe eu dar meus cascudinhos”
Josino num sabia muito bem porque ela tinha aquela mania, mas também num ligava muito, entendia como um carinho da Véia.
Josino continuava encucado com aquele negrinho.
Foi então que num dia ele decidiu pegá-lo e escondê-lo em sua própria casa que ficava na fazenda, porém num canto mais afastado.
O problema seria sua mulher aceitar aquele negrinho dentro de casa.
Ela era a favor da escravidão e num tolerava muito o contato com os negros.
Josino sentia que devia abrigar aquele negro mesmo assim, pelo menos até que aquelas feridas se curassem e o negro ficasse mais viçoso para poder trabalhar.
O Negrinho se chamava Dongô.
Negrinho Dongô!
Ele não era daqueles que aceitava muito bem as imposições que lhe eram dadas, era atrevido e sempre batia de frente com os capatazes,
por isso, não é de se admirar que constantemente era açoitado ou ficava de castigo, preso com correntes em seus tornozelos.
Os feitores da fazenda de onde vieram os negros recém-chegados, já sem paciência com Dongô, apertavam as trancas mais do que se precisava, só para judiar ainda mais daquele negrinho peste.
A esposa de Josino negou de imediato a sua proposta.
Mesmo assim, em uma oportunidade certeira, Josino pegou o negrinho e o levou para a sua casa.
Sua esposa ficou louca com aquilo e na primeira oportunidade da saída de Josino para a fazenda, ela achou um jeito de fugir dali levando a filha deles.
Na verdade, nem mesmo Josino sabia por que estava fazendo aquilo, mas sentia que precisava.
Quando ele chegou de volta em casa e deu por falta da mulher e da filha ficou furioso e triste ao mesmo tempo!
Ele não sabia o que fazer!
Para onde elas teriam ido?
E sua filha?
Josino passou dias nessa inquietação, preocupado e muito triste com aquela situação!
Após dias sem dormir, estava num canto, com as mãos na cabeça, preocupado sobre o que iria fazer, quando então o pai velho chegou e lhe disse:
“Você fez o certo, meu fio!
Num se preocupe que tudo vai ficar bem e você vai encontrar a sua fia! Olhe, vai levar dois anos, mas você vai encontrá-la e é o negrinho que vai ajudar você nisso!”
Aquele velho benfazejo também era vidente e sabia o que esteva falando.
Ele também era muito conhecedor da medicina das ervas e tratou de fazer um misturado delas e passou na cabeça de Josino para que ele pudesse dormir mais sossegado, aquela noite.
Na fazenda, ninguém jamais desconfiava de Josino, uma vez que ele era um homem muito sério e respeitado por lá.
Deram por falta do negrinho, mas também não houve tanto alarde sobre seu sumiço.
Em mais uma tarde onde o cafezinho é certo, Josino vai tomar seu elixir com a negra Vó.
“Esses nego tão dando muito trabalho, Josino?”
- Perguntou a negra em tom quase cantado com fim de puxar assunto para um proseio.
“Nada que eu não consiga contornar, Vó. Muita coisa pode ser resolvida com diálogo, inclusive, muita coisa poderia ser evitada se as pessoas procurassem se entender mais antes de tomar suas decisões” - resmungou Josino num tom quase relaxado.
“É meu fio, você é diferente!
Isso é o que falta mesmo, as pessoas se olhar e se entender nos seus anseios” - completou a negra Vó.
Como não podia faltar, ela tratou de dar os esfregões na cabeça de Josino e este haja resmungar e sair dali.
“Essa véia é doida” - dizia Josino caminhando e passando a mão na cabeça.
Ficava a negra na janela olhando-o com um sorriso faceiro como quem sabia o motivo de fazer aquilo.
O negrinho Dongô num era desses de falar muito, era mais reservado e aceitava a estadia e os cuidados de Josino, com muito bom grado.
Em certa feita, numa oportunidade em que Josino estava em casa se aprontando para ir para a lida na fazenda, enquanto iniciava o movimento de vestir a sua camisa, o Negrinho viu uma cicatriz bem aparente em sua costa nua.
“Essa cicatriz que você tem nas costas foi resultado de uma briga de faca que você se meteu, num foi Josino?”
- Perguntou o negrinho.
Josino, travou no meio do movimento e muito surpreso questionou:
“Como você sabe disso?”
- O Negrinho apenas continuou descrevendo, com detalhes, os nomes dos envolvidos na briga, o cenário, o lugar, o dia…
Josino rápido terminou de vestir sua camisa e perplexo, perguntou novamente:
“Como você sabe disso?
Ninguém aqui sabia!”
Esta tinha sido a primeira vez que o Negrinho Dongô havia falado alguma coisa daquele jeito.
Aquele negrinho era um clarividente dos bons.
Dois anos correram e os dois ainda continuavam ali compartilhando a casa e aquele segredo.
Como o pai velho bem disse, o Negrinho Dongô teve uma visão clara de onde estavam a filha de Josino e sua antiga esposa e lhe contou com grande precisão aonde ele poderia encontrá-las.
Josino muito satisfeito nem perdeu tempo querendo saber como o Negrinho sabia daquilo, apenas confiou e foi ao encontro delas, no lugar citado por Dongô.
Chegando lá, Josino viu uma casa, se aproximou espreitando!
A porta entreaberta revelava alguns pequenos movimentos vindos lá de dentro e com um pouco mais de atenção, podia-se ver dois corpos estirados no chão.
Josino abriu a porta e viu sua pequena filha, agora com sete anos,
sentada no chão brincando com alguns objetos.
Viu também sua antiga esposa caída, bêbada, no chão, junto ao seu novo companheiro.
A criança brincava sossegada como se aquela cena assustadora lhe fosse corriqueira.
A pequena o reconheceu de imediato e correu para o seu colo!
Josino tratou de sair dali com ela, levando-a para a sua casa com o coração cheio de paz por ter a sua filha novamente!
Tempos se passaram e então, num dia normal de trabalho, Josino caiu amolecido no chão.
Ele tinha acabado de sofrer o AVC.
Acudiram-no e este teve tempo e sorte de receber os cuidados de um médico que estava pelas redondezas.
Assim que melhorou, a negra Vó, a do seu cafezinho preferido, lhe contou porque fazia aquilo em sua cabeça!
Cada esfregão que ela dava era um passe magnético para aliviar o problema que Josino carregava em sua cabeça.
Ela via além do que os olhos físicos podiam e sabia que hora ou outra, Josino passaria por aquilo, mas que seus “passes” evitariam a sua morte prematura.
Josino se recuperou e com sua filha aos seus cuidados novamente,
estava mais em paz e confiante.
Todos viam o sorriso largo de Josino e perguntavam de onde vinha aquele alegria, quando ele falava com gosto que havia recuperado a filha perdida.
Perguntavam sobre a sua mulher e aí ele fechava a cara e balançava a cabeça negativamente.
Assustavam-se pois achavam que ela estava morta, e ele logo apressava em dizer que não estava, mas que antes tivesse pois mal não faria mais a si mesma como estava fazendo.
Perguntavam também como ele havia achado ela e logo ele tratava de desconversar, mudando de assunto. Josino era muito respeitado pelos negros da fazenda, considerado homem justo e honesto, e sofria na alma a dor dos negros quando estes eram levados a castigo,
e ainda mais quando as ordens eram para que o próprio Josino fosse a mão castigadora.
Rodeado pelos negros, questionando sobre como achou a filha, e sua esposa e aproveitando para indagarem sobre se ele sabia do sumiço do negrinho Dongô,
Josino espanou dizendo “Ahhhhh!!!
Era só o que me faltava!
Vão cuidar da vida de vocês!
Tenho mais o que fazer do que ficar aqui respondendo a vocês nesse cerco!”
E saia esbravejando, mas sempre com muito respeito por todos ali. Enquanto que os negros riam carinhosamente da “braveza” de Josino.
Josino neste dia, em final de tarde, ouviu um burburinho dos negro na senzala e foi correndo para lá, quando chegando lá viu o querido pai velho (Encarnação de Pai João de Aruanda, um dos mentores do PVSE) com respiração fraca e olhos cerrados.
“Venha, fio querido”, disse o pai velho.
“Ocê tá feliz e eu também posso ir feliz.
Cuide muito bem de quem tá sob sua tutela, não abandone aquela alma especial que caiu nos seus pés como um fruto cai maduro.
Com o tempo verá grande afinidade…
O fio vai ter que prestar contas aos senhores brancos do feito e terá que tomar uma outra decisão e o véi já sabe qual vai tomar, só saiba que pode contar com esse pai veio aqui, que do reino de Oxalá vai olhar por ocê”
Josino, interrompendo o pai já foi logo dizendo “Não! Senhor não vai morrer agora não, é muito moço ainda!”, quando o pai velho deu um sorriso sereno, fechou os olhos e deu o ultimo suspiro.
Todos ali começaram a entoar um cântico de despedida, enquanto Josino de cabeça baixa chorava silenciosamente e repassando na cabeça as palavras do pai velho antes de deixar a fisicalidade.
Mais um bom tempo se passou depois destes acontecimentos e o senhores da fazenda começavam a ficar inquietos pois outro negro havia fugido da fazenda (desta vez Josino não tinha nada a ver com isso) e começavam a cercas os negros e os capatazes, questionando sobre o que estava acontecendo.
Um dos senhores da fazenda se aproximou de Josino foi dizendo:
“Josino, tenho profundo respeito por você e seu trabalho.
Sabemos que é homem correto e de vida séria, quero que você resolva essa situação pois senão vamos ter problemas maiores.
Procure saber o que está acontecendo, por onde anda o negrinho Dongô e esse outro agora que escapou (negro Zulu).
Josino inquieto, sabendo do respeito que os senhores tinham por ele, começou a planejar um jeito de falar a verdade, mas como faria isso sem ter sérias consequências e sempre lembrando-se das palavras do pai velho antes de morrer.
Dias se passaram e a pessoa aumentava, pois os senhores da fazenda começaram a mandar castigar um negro por dia sem que esse tivesse feito coisa alguma.
E mais, mandava o próprio Josino castigar.
“Josino, leve aquele dali e castigue ele…” e Josino engolindo a indignação, ia fazer o mandado.
A cada dia Josino se enfurecia mais e a senhora da fazenda, que observava os mandados do marido mais ao longe, começava a perceber que Josino sabia de algo e que ele engolia a raiva quando o marido dava as ordens para chicotear os negros sem culpa.
No dia seguinte, antes do almoço, o senhor da fazenda chamado Mário, saiu para resolver coisas de negócios mais para cidade,
quando a senhora da fazenda, Sinhá Maria Rosa assumia as tarefas do dia.
Ela, aproveitando que o marido não estava, mandou chamar Josino pois tinha assunto importante para tratar com ele.
Josino chegou já inquieto, pois a dias estava angustiado com toda essa situação.
“Pois não, senhora, em que posso ajudar?”.
“Josino, precisamos conversar a sós”, com ar de malícia.
“Pois não senhora, agora”
Completou Josino.
Ela o levou para uma sala reservada dentro da casa grande e começou a dizer:
“Josino, sei que é bom homem, de coração bom, e que todos aqueles negros apreciam sua presença e não o temem, mas o respeitam.
Eu sei que você não mentiria para nós não é?
Pois sabe do apreço que temos por você e seus serviços.
Mas eu, como mulher, preciso lhe dizer:
“eu não me engano com homem, homem não sabe mentir.
Eu sabia quando meu pai estava mentindo para minha mãe pela respiração dele, pelo olhar dele…” enquanto Maria Rosa ia falando essas coisas, Josino ia ficando mais inquieto, inflando o peito na tentativa de se manter firme, seguro, e certo das suas decisões. Enquanto ela continuava:
“Eu sei Josino, que você tá escondendo algo, que você sabe sobre o desaparecimento dos negros e que não está nenhum pouco satisfeito com os mandados de Mário.
Então chamei você aqui para resolvermos isso entre nós…” e quanto dizia isso, ia levantando um pouco da saia, mostrando os pés e tornozelos com olhar malicioso…
Josino começou a ficar ainda mais irritado e bateu com a mão na mesa:
“Senhora!
Me respeite que sou homem direito, a senhora não vai conseguir nada comigo nesses modos!”
Ela se irritou, baixou a saia e já foi logo esbravejando:
“Ah é!?
Então você vai ver só seu capatazinho miserável, eu vou contar tudo pro Mário, e quero ver se ele vai ainda confiar na sua seriedade!”
Ao que Josino, indignado disse:
“Antes ser chicoteado a deitar-se com a senhora!
Deitaria com qualquer negra daquela senzala, pois todas elas tem mais dignidade que a senhora!”
E saiu da sala muito irritado, deixando a Sinhá furiosa.
Josino saiu da casa grande rapidamente, ouvindo a negra vó abençoar ele… “vai meu filho, meu coração vai com ocê…”, a Vó já sabia o que Josino estava planejando.
Josino rapidamente olhou para trás e disse:
“Avisa a eles vó!”
Pedindo pra Vó avisar na senzala que ele tava saindo da fazenda e já foi para sua casa, rapidamente.
Chegando lá já foi logo dizendo “Se arruma Dongô, vamos embora”,
apressando a filha também pois eles precisavam deixar a fazenda o quanto antes.
Enquanto arrumava as coisas, ia pensando em como faria para sair dali com um negro na garupa do cavalo com sua filha.
Josino tinha um bom cavalo, ele quentaria, pensava ele.
Rapidamente montaram no forte cavalo e saíram em disparada,
enquanto que a Sinhá já estava do lado de fora da casa grande procurando algum movimento que indicasse que ele fosse sair da fazenda, mas Josino conhecia aquela fazenda como a palma da mão, assim, saídas mais secretas não eram problema para ele, ele acharia uma forma de sair discretamente.
Ao final do dia, Mário estava chegando em casa, encontrado a Sinhá Maria Rosa inquieta.
Ela passou esse tempo planejando uma boa história para contar para ele, deixando Josino em situação delicada.
Ele já foi entrando em casa e ela já foi logo dizendo “Josino, Mário,
foi Josino!
Ele que soltou os negros!
Ele confessou!
Confessou e fugiu!
Eu desconfiava, chamei ele aqui e ele veio, pressionei ele e ele confessou e saiu fugindo!”
Mário ficou indignado:
“O que!?
Como?
Era nosso homem de maior confiança!
Como pode nos trair dessa maneira!
Vou atrás dele onde ele estiver!”
Ao que a Sinhá Rosa não pode conter o sorriso de canto de boca,
satisfeita com a reação do marido.
Tratou ele de reunir seus melhores homens e sairem atrás de Josino, que já estava bem longe dali.
Os homens diziam “Senhor, já é noite, eles já devem estar longe, não é melhor no claro do dia pois teremos mais chance.”
“Não, é agora, mas se tiver convarde aqui é bom que diga logo pois assim não levo esse peso, já deixo por aqui”.
Ao que todos silenciaram e foram com ele, cerca de 30 homens.
Saíram no meio da noite mesmo, na esperança de acharem eles dormindo pelo caminho.
Amanhecendo o dia, já chegando na cidade mais próxima,
perguntavam se alguém havia visto um homem num cavalo com possivelmente uma menina na garupa.
(Pois até aquele momento não sabiam que o negrinho Dongô estava escondido com Josino).
Aqueles que iam encontrando não haviam visto, e eles continuavam a procura.
Enquanto que Josino, sua filha e Dongô, estava um pouco mais distantes
Dongô teve uma forte crise de dor de cabeça, começando a gritar com uma intensa dor, forçando Josino a parar o cavalo e a tentar ajudá-lo como podia.
Pararam perto de um rio e Josino instruía Dongô a molhar a cabeça…
“Tenha Fé nos teus santos (referindo-se aos orixás), pede e eles te curam” dizia Josino.
Dongô sentou-se numa pedra ali próxima e disse que sua dor de cabeça estava aliviando, quando foi esticando a coluna, deixando-a com uma postura bem ereta, tomando feições serenas e olhar penetrante.
Josino olhando aquilo curioso foi se aproximando para ver melhor,
perguntando se estava tudo bem, ao que Dongô com voz mais grave falou:
“Salve Meu Filho, Salve Sua Herança Ascentral!
Nós honramos sua força e poder interno.
Nós temos acompanhado sua trajetória há muito tempo,
acompanhado sua bondade, seus medos e incertezas.
Saiba que os “santos” os quais se refere são seus amigos também,
e eu sou um deles a falar com você.
Quero que saiba da nossa presença e que, perderás uma rosa do seu jardim, mas ela continuará perfumando de onde ela estiver.
O destino programou assim para que assim seja.]
Deus sabe o que faz, confie e saiba que tudo vai passar
Lembre-se de nós.
Nós estamos em toda parte.
Cuide da rosa que fica para que ela possa crescer envolvida na força e honra que você carrega.
Nós encontraremos em outros momentos, quando seu rosto não for mais o mesmo…
Salve!”
Era Oxalá, o Grande Oxalá (Pai Seta Branca) que deixava sua mensagem através do negrinho Dongô.
Josino ainda que sem entender muito aquele fenômeno, com os olhos cheios de lagrimas, viu o negrinho Dongô voltar a feição e postura habitual.
“O que foi isso?”, perguntou Josino.
O negrinho Dongô mais confuso ainda:
“Hum?
O que?”, Josino percebeu que ele não sabia o que havia se passado, Dongô era um médium de incorporação inconsciente, não se lembrava dos transes.
“Venha, precisamos ir! Está melhor da cabeça?”
Perguntou Josino, ao que Dongô respondeu que sim, e que podiam ir.
Na saída daquela região, ouviram vários cavalos passando e Josino esperou um pouco por detrás das árvores observando.
Ele viu quem eram… eram os homens do Mário, e se espantou mais ainda quando viu o Mário no meio deles.
“A Sinhá fez minha caveira… eles estão me procurando!
Pelo menos não sabem que você está comigo, Dongô, talvez seja melhor eu me entregar e você vai daqui, foge daqui”.
Ao que Dongô inconformado disse:
“Josino, com respeito que me cabe a você, mas você está louco!?
Eu sou um negro, você acha mesmo que vou ter uma vida normal?
Onde quer que eu vá vou ser um escravo.
Antes um escravo ao seu lado do que solto nas mãos de qualquer um por ai.”
Josino, recebendo o impacto daquele magnetismo familiar, sentiu seu coração encher-se com um calor especial que nunca havia sentido, uma vontade imensa de abraçar e proteger aquele ser tomou-lhe a alma e ele sorriu e disse:
“Está bem, vou ver o que posso fazer.
Talvez eu possa dizer que você é um escravo meu, que está aos meus cuidados, só precisamos dar um jeito de despistar eles.”
Ficando mais um tempo ali, saíram suavemente acreditando não ter mais nenhum dos homens da fazenda ali.
Encontraram um lugar onde vendia algumas coisas, pães, bebidas e algumas coisas.
Pararam o cavalo e aqueles ali ficaram observando o negrinho Dongô meio desconfiados, enquanto ele olhava profundamente nos olhos de todos, inquietando quem o encarasse.
A sensação que as pessoas tinham era que ele estava olhando além,
que via algo mais.
E via…
Tanto que muitos não conseguiam encarar ele nos olhos por muito tempo e logo desviavam o olhar.
Entraram naquela venda, e Josino foi escolhendo algumas coisas.
O negrinho longo ficou mais afastado cuidando da menina, filha de Josino, um pouco mais para fora.
Ali, foi entrando um casal e ela com muito preconceito foi logo dizendo ao namorado…
“Ai! Não quero passar perto deste negro fedorento, amor!”
Referindo-se ao negrinho Dongô.
Ao que, com seu ímpeto de sempre, olhou ela profundamente nos olhos e já foi logo dizendo:
“Amor?
Acha mesmo que ele te ama?
Ele está te traindo ficando com sua irmã, Maria Francisca.
Não seja ingênua…
Ele mente para você e só quer levar você para cama, sabe porque?
Porque ele está mais interessado nos bens que seu pai em leito de morte vai deixar para você do que em você…”
Ao que ela ficou com os olhos arregalados, um misto de irritada e surpresa com aquela revelação.
Ela já vou olhando para o namorado e dizendo:
“o que esse negrinho fedorento está dizendo!? Você conhece ele? Porque ele está falando essas coisas?!”
O namorado já foi sacado uma arma e atirando a queima roupa na cabeça de Dongô.
O barulho fez Josino se espantar e já virou procurando Dongô e sua filha.
“Dongô!”, era como se ele já soubesse o que havia acontecido…
Dongô estava morto, com um tiro a queima roupa.
Josino chegou desesperado e o casal já havia rapidamente saído dali.
(Obviamente aquele casal não foi mais o mesmo depois daquelas revelações…).
Josino caiu chorando no chão, com Dongô no colo.
Todos em volta não entendiam aquilo, achando que Josino era louco.
Ouvia-se os comentários:
“É só um negro, porque ele está chorando desse jeito?”
Josino, ignorando qualquer falação ali, pegou Dongô no braço e o levou para o mato, entre soluços e revolta.
Ali, a beira de um rio, jogou o corpo de Dongô, pedindo aos Orixás que o levassem para um lugar de honra, e ao mesmo tempo pedindo perdão por não ter sido capaz de cuidar como deveria.
Um sentimento de culpa o invadiu, que logo foi acalmado por uma intensa projeção de Oxalá.
Josino estava perdido, não sabia para onde iria, não sabia mais o que fazer.
Sentiu uma dor tremenda com a morte do negrinho, não se via mais o brilho no seu olhar como antes.
Algo mudou.
Apesar de sonhar quase todas as noites com Dongô, vestido de branco, com um sorriso branco e bonito e sempre brincando…
“Olha Josino, estou limpo!
Sem machucados nas costas!
Pai Oxalá curou!
Eu estou bem, estou ai com você, ela precisa de você (referindo-se a filha pequena de Josino), ainda vamos nos encontrar!
Será se você vai me reconhecer se eu estiver em outro corpo… e ria…”.
Assim, os dias foram se passando e Josino tentava reencontrar a harmonia no seu coração.
Não foi pego pelos senhores da fazenda, viajou mais para longe e foi levando a vida, cuidando da sua filha…
Uma mensagem de Pai João de Aruanda:
"Meus fios, essa história não é uma linha para ser iluminada, é apenas um conto que esse véio pediu para menina escrever (Neva).
Nesse conto, meus fios, vocês podem ver a força da ética, disciplina e lealdade.
Podem ver a força do amor e a sua pureza, além das percepções lineares da humanidade que ainda via apenas as escalas de cinza.
Muitos daqueles que estiveram nessa época vão sentir seus corações tocados e as lembranças virão, pois é assim mesmo, o akáshico de vocês vai sendo trazido, toda a história de vocês vai sendo contada. Quantos negros foram açoitados e mantiveram-se em amor.
Quantos capatazes açoitaram e mantiveram-se honrando os seus trabalhos, ainda que seus corações estivessem entristecidos por fazerem o que faziam.
Tudo é amor, fios, onde você estiver, fazendo o que você estiver fazendo, é amor.
Às vezes, o amor é mais duro, às vezes, o amor exige mais disciplina,
às vezes, o amor traz dores que precisam ser curadas, às vezes, o amor dói, mas sempre é ele mesmo quem cura.
O que quero dizer é que, o amor está em tudo e em todos, não importa o quão “ruim” seja esse ou aquele, não importa se você tenha que aplicar a lei dos homens com rigor e firmeza, faça-o com amor, com amor em seu coração, porque isso curará seu coração de toda coisa ruim.
A Sinhá da fazenda, ruim como era, havia sofrido maus tratos do pai quando era criança.
O senhor da fazenda, havia sido abandonado pelos pais.
O rapaz que atirou no negrinho era mal amado, não tinha autoestima, pois desde de criança sofria bullying, a moça que zombou do negrinho, namorada do moço, tinha medos de não ser aceita como era, pois aprendera que para ser aceita precisaria estar acima de alguns… enfim, meus fios, não estou aqui fazendo apologia a coisas como essas que trazem tristeza, a maldade, a coisa ruim que machuca, não, não estou, estou enfatizando o amor meus fios.
Que ainda que, como esse véio disse, ainda que precise aplicar a lei,
faça com amor, carinho, com seu pulso firme, mas com amor, sem julgamento, pois você num sabe a história daquela pessoa, você num sabe o que ela já passou e o que a fez fazer aquilo ou que tentou fazer.
A você não cabe julgar com seu coração, cabe, se estiver numa posição de juiz das leis dos homens, julgar com base nas informações dos homens, os chamados atos, mas não com o seu coração.
Aplique a lei com amor, e quando aplicar, transmita amor no seu olhar.
Meus fios, a Terra é uma grande oportunidade de aprendizado, é uma grande oportunidade para vocês amarem mais do que acham que podem.
Que essa história reforce o amor em seus corações e ajude vocês a olharem todos na Terra como irmãos, independente do que tenham feito, de qual atrocidade tenham cometido, olhem com amor e respeito, pois é assim que Deus olha.
Não me venham dizer que Deus olha com fúria, pois não é esse o Deus que esse véio conhece.
Que a lei seja cumprida sempre, na força do amor, pois é nessa força que a regeneração acontece, e vocês são aqueles que carregam debaixo do braço a lei do amor ao próximo. Jesus confiou em vocês,
ele confia e ele sabe quem são vocês, pois ele disse…
“Amem-se uns aos outros como eu vós amei…” ele não colocou entre parênteses:
“Exceto os maus”.
(Risos …).
Salve Deus meus fios, Salve Deus!
Que Nosso Senhor Jesus cubra vocês com o manto sagrado do amor incondicional.
Salve Deus, Salve Suas Força!"
Neva (Gabriel RL)
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Pela Verdade, nada mais que a Verdade,
Em Amor e Bênçãos,
Neva (Gabriel RL)
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